SIMPOSIO REG-12: “Las distintas modalidades de desarrollo de los pequeños y medianos
productores agrícolas en América Latina”.
PONENCIA: “Dilemmas
and perspectives for the Agrarian Reform in Brazil”. Danilo
Nolasco C. Marinho, Professor, Sociology Department and Research Center on
Americas, Universidade de Brasília, Brasília-DF, Brasil. nolasco@unb.br
.
Abstract. The paper analyzes Agrarian Reform policy in Brazil
over the last ten years and outlines the perspectives for the next years.
Agrarian Reform Policy in Brazil has been only carried out in periods and
regions with social conflicts or in response to huge protest movements with
reverberation in society. More than four hundred thousand families have been
settled over the last years. Social movements of rural workers galvanized
public opinion in the last decade and changed demands for material goods into
an ideological and political platform. The current Brazilian Government,
delivering a left-wing speech, begins to have an increasing difficulty to face
up to protest movements. The paper concludes that the current Government is
compelled to maintain the same grounds of the Agrarian Policy from the former
Government. The limits of the Agrarian Reform policy stem from budget problems,
legal problems in the disclaim of land and the government techno-burocratic
capability to implement the programs.
Resumo. O trabalho faz uma análise da
política de reforma agrária no Brasil nos últimos dez anos e delineia
perspectivas para os próximos anos. A política de reforma agrária no Brasil só
tem sido implementada de forma significativa em períodos ou regiões de
conflitos sociais ou
frente a grandes movimentos reivindicatórios com repercussão na sociedade. Mais
de quatrocentas mil famílias foram assentadas nos últimos anos. Movimentos
sociais de trabalhadores rurais galvanizaram a opinião pública na última década
e transformaram demandas por bens materiais em plataforma política ideológica.
O atual governo brasileiro, com discurso político de esquerda, começa a ter
crescente dificuldades para enfrentar os movimentos reivindicatórios. O
trabalho conclui, que o governo atual, será compelido a manter os fundamentos
da política de reforma agrária do governo anterior e que, os limites da
política de reforma agrária, decorrem de problemas orçamentários, de problemas
jurídicos na desapropriação de terras e da capacidade do aparato
técnico-burocrático governamental de implementar os programas.
A REFORMA AGRÁRIA NO BRASIL: DILEMAS E PERSPECTIVAS
A questão agrária, problema
histórico da sociedade brasileira,
inicia o século XXI com impasses a serem enfrentados. Muitas foram as
legislações e investidas políticas para um modelo de reforma agrária que atendesse aos interesses da população
rural brasileira. As análises da realidade rural brasileira foram sempre
contaminadas por interesses econômicos classistas ou por perspectivas
ideológicas sectárias que produziram ou
interpretações simplistas, que propugnavam soluções tipo “passe de mágica”, ou
revolucionárias, que aspiravam a mudança da ordem política vigente. Outra
característica das análises da questão agrária é a separação da questão agrária
da questão agrícola. Política agrária é demanda da esquerda, política agrícola
é demanda da direita. Esta visão esquizofrênica perdura, como se as ações de
política agrícola não interessassem aos beneficiários da reforma agrária.
O meio rural/agrícola brasileiro
possui importância notável. O Brasil possui uma das maiores áreas agricultáveis
do mundo; é o país que possui o maior potencial de expansão da fronteira
agrícola; está entre os maiores produtores mundiais dos principais produtos
agropecuários; a exportação de produtos agrícolas e seus derivados representa
parcela importante da balança comercial; a população rural concentra quase 50
milhões de pessoas, sendo que cerca de 30 milhões de pessoas compõem a
população economicamente ativa no campo. Ao lado de tecnologias e práticas
tradicionais e ultrapassadas, o País apresenta um perfil tecnológico de última
geração em termos de exploração agropecuária, sendo pioneiro em avanços
tecnológicos para regiões tropicais. Além disso, está ocorrendo um processo de
reestruturação produtiva intenso e regido pelo mercado globalizado, que
redefine suas características econômicas e sociais.
Por outro lado, o Brasil é um dos
maiores países do mundo em concentração da propriedade da terra o que tem
provocado, nos últimos anos, crescimento dos movimentos sociais das populações
rurais sem terra e de produtores familiares empobrecidos. Exacerbados pela
reestruturação produtiva em andamento, tais grupos rurais acabam engrossando as
fileiras do desemprego e subemprego urbano e rural, além de comporem, em grande
proporção, um quadro social que apresenta baixo nível de escolaridade,
problemas endêmicos de saúde e insuficiente acesso aos bens e serviços, ou
seja, índices generalizados de pobreza e miséria.
As
políticas governamentais para enfrentar a questão agrária só têm sido
efetivadas, em geral, em períodos ou regiões de tensão ou conflitos ou frente a
grandes movimentos reivindicatórios com repercussão na sociedade. As políticas
de reforma agrária são justificadas ora em uma perspectiva de política social
para diminuir tensão e conflitos sociais, diminuir as injustiças quanto ao
acesso à terra, evitar o êxodo rural intenso e garantir a sobrevivência física
dos assentados pela produção agrícola de subsistência; ora em uma perspectiva
de política econômica no sentido de aumentar a produção de gêneros
alimentícios. A reforma agrária como política social é que obteve relativo
sucesso, principalmente nos últimos anos, tendo em vista o grande número de
famílias assentadas e a quantidade de área incorporada. Entretanto, o sucesso
de um programa de reforma agrária não pode ser medido somente a partir das realizações em termos de áreas
desapropriadas e do número de famílias assentadas.
O
que é visto pela sociedade na cena agrária brasileira são as ações dos
movimentos sociais e dentre estes, particularmente, as do MST (Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra). O MST tem sido um protagonista fundamental na
história recente da reforma agrária no Brasil e, atualmente, se configura,
principalmente, como um movimento de assentados em assentamentos de reforma
agrária.
Uma
conseqüência da implementação da política de reforma agrária é que, quanto mais
se assenta, mais se fortalece os movimentos reivindicatórios dos assentados,
que aumentam em quantidade e organizam suas demandas. Embora o discurso para o
público externo enfatize a necessidade de criação de novos assentamentos e a
incorporação de novos assentados, o principal fator de mobilização nos
assentamentos são reivindicações de créditos, de infraestrutura e de benefícios
variados. Nesse ponto se localiza uma característica do MST, a transformação de
demandas materiais de bem estar em um discurso político-ideológico.
Um
grande mérito do MST foi mobilizar um setor da sociedade que é de difícil
mobilização, uma parcela da sociedade que está nos limites da privação e da
exclusão. Nos assentamentos que tem presença, faz o que o Estado não tem
condições de fazer, que é promover a ressocialização dos beneficiados pela
reforma agrária. A ressocialização, a reeducação plena da pessoa para sua nova
circunstância social e histórica, exige um envolvimento muito intenso dos que
estão sendo ressocializados, e muito intenso dos agentes de ressocialização,
coisa difícil para os funcionários do Estado, os funcionários públicos. É
lamentável que haja tantas dificuldades para que MST e o Estado se completem
nesse papel de transformação social. O pressuposto político ideológico de MST,
desloca sua referência social e política para o âmbito da contestação do Estado
vigente .
José
de Souza Martins (MARTINS, 2000), insuspeito estudioso da história agrária
brasileira, considera que a experiência de “reentrar” na sociedade através de
um assentamento, que é um instrumento da ordem do Estado, ainda que com
progresso, e, por meio dele, de um compromisso com essa ordem, muda
substancialmente a situação social desses atores e reorienta suas condutas e
suas expectativas. O período de luta social, dos movimentos coletivos
capturados por grupos de orientação ideológica, é uma espécie de intervalo
temporário na vida dos trabalhadores envolvidos. Uma espécie de colocação entre
parênteses dos valores e aspirações que lhes são mais caros. Desta forma, as
mobilizações de assentados, com exceção da direção política do movimento, se
dão em função de demandas materiais objetivas. Essa situação contradiz com a
retórica revolucionária do MST, que concentra sua pedagogia política na idéia
maniqueísta de que a luta pela terra é uma luta entre o bem o mal, em que o
Estado, e suas instituições, também é inimigo.
Existem
mitos e falácias a respeito da reforma agrária no Brasil. Provavelmente o mais
freqüente é que o País tem muita terra disponível e, portanto, basta
distribuí-las para atender a toda a demanda. Quando se observa o mapa do
Brasil, verifica-se um imenso vazio de ocupação humana no Centro-Oeste e no
Norte. O problema é que são terras sem acesso ou inadequadas para agropecuária.
Terras que possuem acesso a estradas, eventualmente energia elétrica e
proximidade a mercados consumidores, têm dono. Ou seja, mesmo que improdutivas,
necessitam ser desapropriadas para efeito de reforma agrária. O que significa,
ser compradas pelo poder público. O Governo Militar tentou colonizar áreas
amazônicas com agricultores familiares, a maioria abandonou seus assentamentos.
Foi uma maldade coloca-los naquela situação, nas terras amazônicas é necessário
“pular de paraquedas” para acessá-las. Outra falácia, basta vontade política
para fazer reforma agrária. Sim, é necessário vontade política e muitas outras
coisas. Os limites de uma reforma agrária em grande escala decorrem de
problemas orçamentários, de problemas jurídicos e da capacidade do aparato
técnico-burocrático governamental em implementar e assistir a reforma agrária.
O
atual governo brasileiro, do presidente Luís Inácio Lula da Silva, de um
partido político de tradição de esquerda, sempre teve um discurso a favor de
uma ampla reforma agrária. Uma vez no poder, as dificuldades práticas para
implementar a reforma agrária pretendida se evidenciaram. As dificuldades
decorrem de recursos orçamentários escassos, arduamente disputados por outras
demandas, limitada capacidade do aparato governamental para conceber e
implementar os programas e os problemas jurídicos relacionados com as
desapropriações de terras, antagônicos com um sistema capitalista que enaltece
os direitos de posse. As limitações orçamentárias talvez tenham sido o fator
limitante principal. O resultado foi uma performance do governo, em termos de
número de famílias efetivamente assentadas em 2003, abaixo da média do governo
anterior, considerado neo-liberal (tabela 1). As projeções para o segundo ano
de governo Lula da Silva, quanto à reforma agrária, também não são animadoras.
Os fatores limitantes continuam em efeito, apesar da retórica reivindicativa
dos movimentos sociais a favor da reforma agrária.
Em
termos objetivos para a ação governamental, uma questão central para a política
de reforma agrária é a necessidade de identificar espaços, a partir do quadro
atual do setor agropecuário, nos quais a produção dos assentamentos possa se
inserir de modo sustentável. A sustentabilidade, neste caso, significa não só a
sobrevivência, mas também a possibilidade de produzir excedentes para
investimentos ou, em outras palavras, a instalação de processo de
capitalização. A idéia de que a partir de um programa de reforma agrária seja possível
multiplicar a geração de empregos no campo tem como pressuposto fundamental o
sucesso econômico de seus beneficiários. A viabilidade econômica do
assentamento decorre das condições técno-agronômicas de produção e também da
adequada inserção no mercado. A maioria dos assentamentos de reforma agrária do
País está em condições precárias. Isto serve de argumento para setores
reacionários combaterem os aportes financeiros para implementação da reforma
agrária.
Existem
assentamentos de sucesso no País. O sucesso é explicado pela mobilização dos
assentados, pela organização de cooperativas, pela incorporação de tecnologias,
pela disponibilidade de capital para custeio e investimento, enfim, pelas
possibilidades de inserção na cadeia de produção agropecuária (MARINHO, 1998).
Se o Estado não possibilitar as condições para os assentados em projetos de
reforma agrária incorporarem um padrão agrário moderno conseguirá apenas
retirar parcelas da população da indigência, mas que serão mantidas à margem da
economia brasileira. Assim, o dilema brasileiro é como inserir, não só os
beneficiários da reforma agrária, mas grande parcela do heterogêneo setor rural
brasileiro, nos sistemas agropecuários contemporâneos.
A
política de reforma agrária brasileira necessita conviver e incorporar, no
diálogo que caracteriza a democracia representativa, os movimentos sociais mais
radicais, mesmo os sectários em termos políticos e ideológicos, que se
desenvolveram a partir das condições de atraso, de injustiça e de desprezo que
governos e elites políticas tiveram em relação a grande parcela da população
rural. Deve prevalecer a idéia de que o populismo, o messianismo ou o ativismo
revolucionário não resolverão o problema agrário brasileiro, pelo contrário,
poderão agravá-lo, prejudicando a economia e comprometendo o desenvolvimento do
País, além de trazer o risco de tragédias indesejáveis.
BIBLIOGRAFIA.
MARTINS,
José de Souza. Reforma Agrária: o
impossível diálogo. São Paulo, EDUSP, 2000. ISBN 85-314-0591-2
MARINHO,
Danilo N.C; SCHMIDT, Benício.V.; ROSA, Sueli.L.C. Os Assentamentos de Reforma Agrária no Brasil. Brasília, Editora
UnB, 1998. ISBN 85-230-0517-X
Professor Danilo, este é o texto referente ao resumo da disciplina " Sociologia do desenvolvimento rural"?
ResponderExcluir